Thursday, December 13, 2007

o mito segundo narciso

quando ela morreu, o mundo, infelizmente, não cessou. e os dias passavam agora penosos, eras a cada lua. na floresta onde caçavam, vagueava inconscientemente, entorpecido. havia um vazio nos seus olhos que só viam saída nas lágrimas cheias que pendiam, permanentes.

quando ela morreu, o mundo, infelizmente, continuou. e ele, perdia a continuidade do seu ser, um pedaço de alma, como um pedaço da vida. narciso arrastava os pés por entre as árvores. eco seguia-o sentindo a dor.

nas sombras oblíquas da floresta, por onde haviam passeado as musas nas horas matinais que se iam e por onde hades passearia nos instantes que se seguiam em busca de perséfone para se saciar, jazia um lago que reflectia o céu por entre folhagens. quando caiu, debruçou-se, infinitamente triste sobre as águas espelhadas e serenas.

ali, mesmo ali, jazia a imagem gémea dela. não mais desviou seus olhos da água que chorava com ele. eco, bela, olhou seu corpo moribundo e chorou. no lugar onde narciso adorou a sua irmã, deixou uma flor que ali cresceu.

Monday, December 03, 2007

pai, filho e espírito santo

I - pai

criaste um deus para te servir,
balofo parasita,
idiota prestamista,
tem menos gosto a tua lagosta
que a sandes da minha marmita.

(não ajoelho mais
a esse deus de sacristia
promete abundância à noite,
escassez durante o dia.)
-----

II - filho

põe de lado o terço obscurantista,
construímos futuro rumo à conquista,
vamos juntos, dá-me a mão
se não és filho de deus
foste sempre meu irmão.

-----

III- espírito santo

às vezes até lamento,
que nunca tenhas existido.
teu pai seria o primeiro de castigo merecido.

vontade do trabalho

ergue mais alto a voz,
ergue mais alto o rosto,

mais alta a dignidade,
que se levanta um sol depois de posto.

levanta os olhos,
e no horizonte verás liberdade.

já não sois escravo nem servo,
e vão-se rompendo as rédeas da verdade,

já não tendes dono nem senhor,
mas falta cumprir-se a tua vontade.